segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Análise de Riscos e não só...

CONSIDERAÇÕES SOBRE “AVALIAÇÃO DE RISCO”
Ou como prevenir situações que possam fazer perigar a saúde e o bem estar

Sempre que detectamos uma situação de risco devemos IMEDIATAMENTE, não “instaurar um inquérito”, mas sim implementar medidas correctivas que a eliminem. Não se deve estar à espera que aconteça “qualquer coisa” para decidir essas medidas correctivas, deve-se sim proceder a uma Análise de Risco. Essa é a missão nobre da Segurança no trabalho. Prevenir e não… Remediar! Ser Pró activo e não Reactivo!

Numa análise de risco é muitas vezes interessante construir cenários que possam ajudar a prevenir eventuais situações que façam perigar a saúde das pessoas, as instalações ou o ambiente. Todos nós na nossa vida já usámos esse método de saber “o que é que acontece se…”. Não é portanto um método de todo estranho.

Sendo assim, convido o leitor a usar a sua capacidade criativa e imaginar o que se passa num qualquer laboratório de química de uma qualquer escola, numa qualquer povoação de um qualquer país.

Imaginemos então que um grupo de alunos é incumbido de realizar uma experiência laboratorial usando para o efeito uma série de substâncias químicas. As quantidades são pequenas, da ordem dos 200ml, pois trata-se de um pequeno trabalho de laboratório escolar e não duma produção fabril.

É bom ter presente que as substâncias químicas usadas em laboratórios, mesmo os escolares, podem ser inflamáveis, explosivas, comburentes, corrosivas, tóxicas, nocivas para o ambiente, etc, etc, etc.


É claro que o laboratório escolar por nós imaginado coloca à disposição dos intervenientes da experiência, todo o equipamento de protecção individual adequado, para que os alunos e já agora os professores lidem com essas substâncias químicas em condições de segurança, tais como, óculos, máscaras, luvas, etc.

É claro que também existem, nem poderia ser de outra forma, equipamentos de protecção colectiva tais como duches, lava-olhos, rede incêndio, exaustores de fumos, hotes para a realização de trabalhos, por exemplo, com libertação de gases ou vapores, etc.

É claro que todos os recipientes que contêm substâncias químicas se encontram devidamente etiquetados com o nome da substância, concentração, símbolo de perigo, etc.


É claro que todos os alunos que manipulam substâncias químicas e também os professores, foram adequadamente formados para as saberem manipular em condições de segurança e não fazerem perigar a sua saúde, a saúde dos seus colegas e a de todas as pessoas que possam ser afectadas por um erro de manipulação ou por um acontecimento imprevisto. Está também prevista a vigilância médica em casos considerados especiais.

É finalmente claro que existem armários especialmente concebidos para guardar as substâncias químicas e recipientes apropriados para a recolha das substâncias após o fim da experiência laboratorial, sendo a eliminação desses resíduos feita respeitando a legislação actual sobre a matéria e nunca enviados pura e simplesmente para o esgoto como se de um vulgar copo de água se tratasse!


Até aqui tudo bem quanto ao nosso exercício criativo. Temos então um laboratório onde se utilizam substâncias químicas, os seus utilizadores estão devidamente protegidos com equipamentos de protecção individual e colectiva, os recipientes estão adequadamente etiquetados e guardados em local concebido para o efeito e os resíduos são legalmente tratados.

O nível seguinte do nosso exercício será imaginar uma falha humana. É muito fácil fazê-lo. A nossa cultura vai muito nesse sentido. Quando há falhas que não dá jeito nenhum assumir, encontram-se sempre responsáveis directos que fizeram qualquer coisa que não devia ter sido feita e por isso o acidente se deu. Criam-se assim situações de injustiça e pensa-se que se resolveu o problema, continuando as causas indirectas por resolver, podendo causar acidentes semelhantes no futuro! Posta esta importante ressalva, vamos então continuar e imaginar o cenário possível da falha humana.

Um aluno utiliza na sua experiência uma substância química sem outra nocividade que não seja o seu intenso e muito desagradável odor. O grupo de estudo até achou graça à situação e comentou em tom de brincadeira que era uma coisa interessante para se usar no Carnaval que se aproxima. Portanto nenhum cuidado especial.


A preparação realizada a quente foi deixada num recipiente de vidro devidamente rolhado para evitar a dispersão de vapores da substância química mas devido a uma pequena corrente de ar frio no laboratório o recipiente de vidro rachou com a inevitável consequência da propagação do tal mau cheiro que extravasou a área laboratorial.

Alguém que passou perto do laboratório sentiu o cheiro e começou a investigar a sua proveniência. Suspeitando que se tratava de qualquer coisa que se estava a passar no laboratório da escola, dirigiu-se de imediato para lá e descobriu a origem do acontecimento, o tal recipiente que se encontrava rachado. Mal podia suportar o intenso odor emanado e decidiu sem consultar ninguém, “resolver” de imediato o problema.

O leitor já imaginou de certeza a maneira “expedita” como na prática se costumam resolver estas coisas. “Aquela porcaria está a cheirar mal, vou já tirá-la daqui para fora e metê-la na rua… estes estudantes não têm mesmo juízo nenhum e depois quem não tem nada com isso é que tem que resolver as coisas…”. Não há dúvida nenhuma que é a maneira mais fácil.

Imagina o leitor que uma pessoa que tem este tipo de comportamento se preocupa em saber a nocividade da substância química e as consequências da sua atitude? Será uma substância Tóxica? Inflamável? Explosiva? Isso não interessa nem vem ao caso… o que interessa é que cheira mal e portanto: RUA!!! Lembra-se o leitor da formação necessária de que falámos no início desta crónica?

Pois é!
Continuemos então o nosso exercício criativo. A escola que imaginamos está situada numa povoação de grande densidade demográfica e o acontecimento dá-se a uma hora em que está muita gente na rua. Cedo começam a perceber o tal “cheirinho”. Começa-se a perguntar o que será. Cheira a gás dizem uns, cheira mas é a ovos podres dizem outros. Isto é capaz de ser inflamável, alguém comenta… e é o rastilho necessário para se falar já em situação de crise.

É a catástrofe que se anuncia. Então chama-se a Junta de Freguesia, a Câmara Municipal, a Polícia, a Emergência Médica, a Protecção Civil, os Bombeiros, os jornalistas dos jornais e da televisão… é um acontecimento Nacional!!!! Há mesmo pessoas que vão para o hospital e tudo. Há declarações bombásticas, já se fazem congeminações e acusações. Já se fala, como é hábito, do que se sabe e do que não se sabe naquele ambiente bem conhecido de todos nós de que a melhor testemunha é sempre aquela que não viu nada nem sabe de nada !!!


Investiga-se. Usam-se equipamentos uns mais sofisticados que outros, para saber do que se trata. Analisa-se a atmosfera mas nada! Não há conclusões nem se sabe a origem. Finalmente alguém emite um resultado. NÃO É INFLAMÁVEL! Ainda bem. Olha se fosse…

Claro que mais tarde sabe-se a verdade ou talvez a meia verdade.
Foi num laboratório da escola. Foi a mulher da limpeza. É uma ignorante! Muito embora toda a gente saiba que a dita “mulher da limpeza” não tem acesso ao laboratório mas isso é um pormenor que não interessa nada para o caso. Foi a mulher da limpeza e pronto!

Fim do nosso exercício!
Convido o leitor a descobrir os erros cometidos neste hipotético cenário no qual se desrespeitaram algumas boas práticas de segurança e investigar se no seu local de trabalho, na sua escola, em sua casa, não há situações semelhantes. Em caso afirmativo faça uma análise de risco. Descubra as causas. Introduza acções correctivas. Controle a sua aplicação e a sua eficácia. Não há outra maneira de RESOLVER, mesmo, estas coisas. A bem da saúde e do bem estar de todos!



Nota final:
Declara-se que qualquer semelhança com factos reais é pura coincidência!

3 comentários:

Anônimo disse...

Optimo exercício, parabéns.Faz-me lembrar um acontecimento idêntico de há poucos dias...
Mas estou no sítio certo para fazer perguntas, apenas perguntas.
Será que todo o pessoal afecto a laboratórios tem a formação necessária e adequada? Será que os responsáveis estão atentos e activos no controle de hipoteticas situações de risco? Será que numa situação, como a descrita, o problema foi bem encaminhado?

Artur.S disse...

Excelentes perguntas!
Também as faço muitas vezes e há muitos anos!

edinha disse...

Em primeiro lugar dou-te os parabéns porque isto está MAGNIFICAMENTE bem escrito.
Em segundo lugar esta situação hipotética tem muito a ver com muitas situações reais que andam por aí:)
Beijinhos.